Na trajetória de quem vive e respira música, chega um momento em que percebemos que, para avançar, precisamos dar um passo atrás. Talvez seja a técnica que não está fluindo como deveria, um hábito que se tornou uma barreira ou até mesmo uma maneira equivocada de abordar o aprendizado e a prática. Esses momentos de desconstrução, embora cruciais, podem parecer uma tempestade emocional: a sensação de recomeçar do zero, abandonar o que já foi feito e questionar se tudo vale a pena.
É um processo que exige coragem. Desfazer hábitos enraizados não é tarefa fácil. Parece que estamos renunciando ao que já conquistamos e colocando em dúvida a nossa própria capacidade. Nesse ponto, o peso emocional pode ser esmagador, gerando o que muitos descrevem como o ápice do desânimo. Afinal, ninguém gosta de sentir que está retrocedendo, principalmente em algo que se ama tanto.
Mas é justamente nesse momento, quando tudo parece mais desafiador, que reside o poder transformador do recomeço. Quem se permite aceitar essa fase e encara o processo de desconstrução com paciência descobre algo muito maior. É como renascer com uma visão mais clara, mais madura e mais consciente do que realmente importa.
Ao permitir-se recomeçar, você não apenas ajusta sua técnica ou desfaz hábitos prejudiciais; você também redefine sua relação com a música e consigo mesmo. Esse renascimento pode trazer uma motivação renovada, um prazer redescoberto no ato de tocar ou compor. Você não está apenas corrigindo erros — está criando uma nova base, mais sólida, para o seu crescimento.
Por mais difícil que pareça no início, recomeçar pode ser o segredo para liberar seu verdadeiro potencial. Afinal, a música, assim como a vida, é feita de ciclos. E a beleza está em cada renascimento, em cada novo começo que nos torna mais fortes e mais conectados ao que realmente amamos fazer.
Seja paciente consigo mesmo, abrace esse processo e confie que, ao atravessar essa fase desafiadora, você emergirá mais motivado, mais apaixonado e mais preparado para alcançar os seus sonhos musicais. Recomeçar não é o fim — é a chance de começar de novo, mas desta vez, com ainda mais força.
O que poucos mencionam é que esse processo não acontece apenas uma vez. Ele se repete ao longo da jornada, às vezes em intervalos de meses, outras vezes após anos de prática. Dependendo da intensidade da dedicação e do nível que se busca alcançar, é comum vivenciar esse ciclo a cada dois ou três anos. No entanto, mesmo músicos mais experientes continuam enfrentando esses desafios em fases distintas de suas carreiras. Isso é natural, porque cada avanço traz novas demandas que exigem ajustes, aperfeiçoamento e, muitas vezes, recomeços.
E o mais importante: não há como fugir disso. Independentemente de quem você seja ou do quanto já evoluiu, esses momentos fazem parte do processo de crescimento. Eles são inerentes à aprendizagem, porque a música, assim como qualquer outra arte, é infinita em suas possibilidades. À medida que avançamos, nossos padrões se elevam, e aquilo que antes parecia satisfatório passa a exigir uma revisão mais profunda.
Pode ser doloroso, sim, mas é também um rito de passagem. Ao aceitar que esses períodos de desconstrução são inevitáveis e até necessários, você pode transformar a experiência de recomeçar em algo muito mais leve. Em vez de lutar contra esse ciclo, abrace-o como uma oportunidade para crescer e se reinventar.
Ao final de cada recomeço, você não será mais o mesmo. Sua técnica será mais sólida, sua compreensão mais ampla, e sua paixão pela música ainda mais profunda. Quem aprende a lidar com esses momentos difíceis descobre um segredo valioso: cada renascimento traz uma motivação renovada e um prazer ainda maior em fazer música.
Então, lembre-se: recomeçar não é retroceder, mas sim recalibrar sua jornada. Aceite esses ciclos com paciência e coragem, pois eles acontecerão várias vezes. E, a cada vez, você estará mais preparado para alcançar o próximo nível daquilo que tanto ama.
Certa vez, um aluno me perguntou, com um olhar cheio de curiosidade e ansiedade: “Estava reparando que a sua maneira de palhetar é muito diferente da minha, é mais limpa e consistente. Você pode me ensinar? Como eu faço para atingir esse nível de precisão?”
A pergunta era direta, mas a resposta não era tão simples quanto eu gostaria. Olhei para ele e disse: “Durante o processo, a forma como você manuseia o instrumento vai mudar inúmeras vezes, isso aconteceu comigo e acontece o tempo todo. Não existe um padrão fixo que dure para sempre. E sabe por quê? Porque você também está mudando — como músico e como pessoa.”
No início, ele pareceu confuso, como se esperasse uma fórmula mágica ou uma lista de passos infalíveis. Foi então que expliquei que o caminho para o palhetado perfeito (ou qualquer outra técnica) é muito mais orgânico do que parece. Quando começamos a aprender algo, geralmente adotamos a posição ou o movimento que parece mais confortável no momento. Com o tempo, à medida que nossos músculos se fortalecem, nossa percepção melhora e nos tornamos mais conscientes do som que queremos produzir, percebemos que aquele padrão inicial já não atende mais às nossas necessidades.
E isso é completamente normal. Durante o aprendizado, é esperado que você ajuste sua postura, a posição da mão, o ângulo da palheta e até mesmo o modo como você segura o instrumento. Esses ajustes acontecem não porque você estava “errado”, mas porque cada etapa exige algo diferente de você.
Eu contei a ele que, mesmo após anos de prática, ainda me pego ajustando pequenos detalhes na forma como palheto. Às vezes é a posição do polegar, outras vezes é o movimento do pulso. Esses ajustes não são falhas — são sinais de evolução.
Terminei dizendo: “Aprender música é como moldar algo com as próprias mãos. A cada movimento, você ajusta, melhora e se adapta. Esse processo nunca termina, e é isso que torna tudo tão especial. Se a maneira como você toca hoje não é a mesma de ontem, isso significa que você está no caminho certo.”
O que aprendi ao longo dos anos — e espero ter transmitido a ele — é que a música não é estática. Cada músico tem sua própria jornada, cheia de adaptações e recomeços. E quando você aceita que a evolução é contínua, começa a ver esses ajustes como parte do prazer de tocar.
Por isso, se você sente que precisa mudar algo na forma como toca, não se preocupe. É assim que funciona. Não existe um ponto final na técnica, só um caminho cheio de novas descobertas.
Quem nunca se pegou pensando, após meses ou até anos de prática: “Será que eu realmente aprendi alguma coisa? Parece que eu ainda não sei tocar nada.”
Esse tipo de reflexão pode ser esmagadora. Pior ainda é quando você decide olhar para trás, revisitar um vídeo antigo de uma apresentação ou ouvir uma música que gravou tempos atrás, e a única coisa que consegue sentir é vergonha ou insatisfação. De repente, parece que todo o seu esforço foi inútil, que você não evoluiu o suficiente, ou que talvez, de alguma forma, você simplesmente não seja bom o bastante.
Mas aqui está a grande reviravolta: sentir isso é, na verdade, uma das provas mais claras de que você está evoluindo como músico.
Se hoje você olha para algo que produziu no passado e sente que poderia ter feito melhor, é porque seu nível de exigência aumentou. Isso significa que você desenvolveu um ouvido mais refinado, capaz de perceber detalhes que antes passavam despercebidos. E isso é um grande sinal de que você está evoluindo, não regredindo.